O clima pesado dos barracos de El Diablo não estavam tão presentes naquela manhã.

Ardyn, praticamente, não conseguia enxergar muito bem devido ao olho direito um pouco inxado de uma briga que tinha tido recentemente, numa expedição ilegal que acabou não dando muito certo. Mas mesmo assim ele seguia sua rotina, próximo ao meio dia, estava lá novamente pelas ruas da favela, praticamente bebado a ponto de cometer o erro de deixar uma das suas adagas pra fora, o que trazia alguns olhares incrédulos até mesmo de quem o conhecia. Mas ele simplesmente não estava nem aí.

O sol castigava bem cada alma que passava sobre suas luzes, obrigando a maioria das pessoas nas ruas a andarem com seus trapos tampando parte do corpo naquele dia. Cambaleando, a camisa jogada sobre os ombros e a destra segurando uma garrafa de cerveja, o garoto mal conseguiu ver o que o fez descambar sobre um menor a sua frente. Ele deu mais alguns passos a frente, já ignorando o garoto, mas precisou retornar o olhar quando passou por ele e ouviu um pedido de desculpas.

- Ah, acontece... Eu não estou enchergando muito bem e, sabe como é, tá tudo girando. - Riu, levantando a garrafa a altura do olhar do garoto. A voz começando a se embolar junto as palavras.

- Aliás, de onde voce é? Estou louco mas não o suficiente pra desconhecer uma alma de El Diablo que não me olhe com obliquidade. E que tenha o respeito suficiente pra pedir desculpas... É de fora?

Nenhuma resposta.

E ele não fazia ideia se a bebida já tinha feito efeito o suficiente pra tirar seus sentidos de audição, fazendo com que ele não escutasse qualquer som do garoto, mas a boca também parecia não se mexer, permanecendo como a estátua que tinha sido segundos antes do esbarrão. Parecia medo, mas também parecia receio, principalmente pelo passo para trás assim que o garoto desviou o olhar para a lamina na cintura de Ardyn. Ele olhou pra baixo também, seguindo o olhar do desconhecido e finalmente tomando a decisão de vestir sua camisa e esconder um pouco da faca num coldre que estava pendurado ao seu lado direito do abdômen.

- O que é, algum gato comeu sua lingua é? - Deu mais um gole na cerveja, terminando e deixando o vidro numa bancada que tinha logo ao seu lado. El retirou a camisa dos ombros e pos-se a vestir, finalmente.

- Anda, desembucha. Isso aqui é meio perigoso pra você. Aliás, não sei se reparou, mas - Ele se aproximou um pouco, tomando o ombro do garoto para poder sussurrar - Há 3 homens te acompanhando de soslaio. O que veio fazer aqui

 - Hm, ok. Instante.

Ardyn recostou sob a bancada que tinha a sua direita, a mesma onde havia colocado a garrafa e cruzou os braços esperando o garoto. Num giro de calcanhar, ele passou a acompanhar seu olhar aos rapazes que o seguiam talvez por horas. Obviamente, os charlatões passaram a tentar desviar suas atenções para momentos e lugares aleatórios quando o menor tomou eles em seu campo de visão.  O moreno tentou analisar o que tanto o rapaz olhava, sorrateiramente notando alguns pontos que poderia usar a favor.

Mas o mais improvável estaria pra acontecer.

- Mas que porra é essa.....  - Aos poucos, viu alguns canos se movimentarem de dentro para fora, contorcendo-se a ponto de causar rachaduras maiores do que as que já tinha a ponto de romperem-se de forma rude, levando tudo que tinha de menor peso pelos ares. A fumaça tomou o local rapidamente, misturando-se com palha e a própria areia das ruas, praticamente formando uma minuscula mas eficiente tempestada de areia. Os gritos de desespero vieram logo em seguida, mas Ardyn já havia pulado do seu encosto até o garoto assim que notou as variações nos canos próximos aos olheiros. Ele o tomou pelo pulso antes que toda confusão tornasse sua visão quase nula.

A primeira casa a frente foi onde entrou, carregando consigo o rapaz. Ele olhou para os lados, procurando a melhor saída mas notou todo o vapor tomar as janelas do comodo, uma senhora segurando algumas panelas e um garoto de aproximadamente 10 anos comendo sobre uma mesa, com a colher parada em meia altura, olhando incrédulo para a invasão que havia acontecido.  - Ok, senhora Fitzgeralt, já estamos de saída... -

Continuou andando, passando pela cozinha e tomando a parte de trás da casa, com um muro tão baixo quanto um buldogue - Eu não sei o que diabos é cerne. Mas sei que vai se de um lugar que vai poder ficar mais sossegado.  - Ao redor, procurou alguns panos que fossem o suficiente para cobrir um pouco do visual do garoto e o jogou em seu peito - E coloque isso - Passou parte do pano pelo pescoço e terminou cobrindo parte da cabeça do garoto com um capuz - Voilá. Um típico Diablo... Agora vamos, é melhor voce sair daqui.

Ardyn apontou o caminho para o garoto, esperando que ele fosse na frente.

Atrás do pequeno muro, uma altura considerável de quase 10 metros, com algumas carroças loteadas com palha seca, o suficiente para afofar a queda.

A reclamação pelo pano demonstrava que Ardyn estava bem certo sobre o garoto não ser da região, tampouco imaginava como os suburbanos tentavam se cobrir para evitar amostras grátis de pessoas prontas para serem sequestradas ou furtadas. – Bem, você não precisa entender, só tente não se mostrar muito pelas ruas. Isso aqui não é Kaleo.

Pego de surpresa, o moreno não acreditou muito na ação repentina do rapaz, que se jogou sem menos pensar duas vezes. Claro, aquilo não era uma situação que os deixassem loteados de saídas melhores, mas ele parecia tão apático quanto a situação que acabara de colocar ao redor dos dois. Em seguida, a gritaria nos cômodos que acabaram de sair começou a seguir de vozes procurando pelos dois, Ardyn não teve muita opção a não ser se jogar também o mais rápido possível.

A queda não foi um tanto agradável, principalmente para as costas do rapaz que não teve a mesma sorte do menor, encontrando sob a folhagem pedaços secos de terra e lama. Ele se levantou com as mãos sobre as costelas, a feição demonstrando uma dor incomoda e o fazendo andar com um pouco de dificuldade, mas muito mais pelo drama que sempre fazia do que qualquer coisa. Ardyn tinha aquele estilo, brincalhão quase o tempo todo em suas façanhas, mesmo que estivesse quase perdendo sua vida vez ou outra, suas piadas praticamente quase nunca saíam de cena.

- Cara.... Eu odeio essas carroças. Vem.

Ardyn olhou para cima, observando aos poucos a fumaça tomar um pouco da fachada onde estavam, encobrindo o muro e tirando a visibilidade que eles teriam quando olhassem para baixo. Dando o time certo para que eles pudessem finalmente estarem livres dos idiotas que haviam restados.

                         
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Quando adentrou ao bar, subiu as escadas e procurou a mesa mais ao canto. As cadeiras velhas de madeira cheiravam a bebida, o lugar perfeito para o garoto conseguir relaxar praticamente em todas as suas tardes.

- Ok, eu não sei quem diabos você é, mas sei exatamente o que fez e que isso provavelmente irá cair totalmente em minha conta. O que faz em El Diablo, garoto?

Assim que chegaram, uma moça jovem - loira, com olhos âmbar e vestida com um avental que protegia até seus cabelos - colocou dois copos sobre a mesa e manteve um olhar para Ardyn, devidamente questionando a presença do rapaz em seus recintos. O moreno deu de ombros, revirando os olhos e apenas ignorando-a. Não tinha muito o que fazer, e também não queria deixar que o garoto se metesse em confusões demais por El Diablo, pelo menos até saber do que se tratava.

O olhar sempre sério do garoto, como se tivesse analisando cada pixel de todos os lugares que passava, não cessava nunca. E até então quieto, demonstrava não estar amedrontado ou pouco familiarizado com tudo que se passava em El Diablo. Os bancos sujos nem sequer fora um problema para que ele se sentasse, o mau cheiro também não pareceu tirar caras feias do adolescente, que apenas continuava encarando Ardyn.

- FORCH.. – Questionou. Alterando um pouco do tom da voz, que chegou a falhar bem no final da frase em perceber que estava alto demais. Um pigarro o ajudou a acalmar-se e respirar, o suficiente para desviar o olhar ao redor e notar algumas vozes diminuírem o tom e pessoas desviando seus olhares assim que eram confrontados pelo olhar de Ardyn; inclinou um pouco do corpo, diminuindo a distância entre os dois.

- Como assim voce não tem um propósito de estar aqui? Sabe como as coisas estão por El Diablo? Tudo que precisam é de uma cabeça nobre pra pendurar na entrada do Distrito.

Ele recuou, descansando sua coluna dolorida, arrancando-lhe algumas boas feições de dores. A destra tomou o copo que havia sobre a mesa e levou até a boca, derramando o líquido inteiro pela garganta rapidamente, mal percebendo que toda a adrenalina de pouco tempo tinha drenado toda o álcool do corpo do recém adulto.

- E ainda com sua idade... – Colocou o copo sobre a mesa. – Você é quase uma bomba relógio para o stopim de uma guerra civil.

A destra chamou a mulher novamente a mesa, e usou o indicador para apontar para o copo.

Ardyn não pode deixar de rir com as opções que o garoto havia deixado pra ele. Definitivamente, tudo que o garoto queria era realmente se envolver, chamar confusões a todo custo, mostrar de vez para todo o império que El Diablo não estava caído aos seus pés de forma integral.

- Sempre estivemos assim, Garoto, qualquer gota de sangue hoje em dia pode ser o estopim que precisamos.

Ardyn ajeitou sua postura e entre alguns risos concentrou-se por tempo o suficiente para recuperar-se da dor, controlando um pouco mais da sua energia para que tratasse de tirar as dores e dar ao homem a disposição ideal para o começo de um dia novamente, mas as próprias palavras de Forcheim não permitiam que ele mantesse total atenção em suas habilidades, levando o novamente a algumas risadas.

- Então, eu já estou envolvido dos pés a cabeça em cada detalhe para uma nova guerra civil. Eu mesmo poderia arrancar sua cabeça, mas prefiro deixar isso para um outro dia, hoje estou descansando e...

''E realmente, ele adora arrancar cabeças, sabia? Todos os dias aparece com alguma nova cabeça pendurada em sua cintura como um premio e nossa, ele é o mais corajoso de Diablo, realmente acredita?'' A mulher retornou, interrompendo Ardyn com uma ironia demasiada depois de encher o copo do homem novamente. ''Porque diabos trouxe um nobre para cá?''

O sorriso desapareceu aos poucos da face do garoto, que fora tomado por expressões mais incrédulas e desnecessárias. - Essa é Ellie. Como pode ver, ela tem ouvidos um tanto aguçados demais.