O sonho de infância de Amren tinha sido provar ao seu pai que, mesmo sendo mulher, podia ser grande. Que podia ser uma militar de sucesso. Mas nunca tinha almejado o cargo que era dele. Nunca tinha nem sequer cogitado essa possibilidade. Para ela, seu pai era um homem forte, destemido e imbatível que, apesar de ser um homem bastante cruel, estaria ali para sempre. Nunca imaginou que ele deixaria o mundo dos vivos de forma tão repentina, lhe deixando seu cargo. Amren nunca quis ser uma general, mas ainda assim se tornei uma. Afinal, não podia simplesmente falar "Não, obrigada.", então passou a exercer a função com tudo o que tinha. Tinha sido criada dessa forma e não mudaria agora, se tinha que ser feito, que fosse feito direito. E é por isso que, em um dia tão ameno como aquele, a garota deixou seus aposentos extremamente confortáveis em Calipso para se dirigir à base militar de Le Ange para acompanhar o treinamento dos seus soldados charmosamente rudes da tropa expedicionária: uns fanfarrões corajosos e bem treinados que gostavam de se aventurar muralhas afora.

Ao chegar à base, a ruiva logo foi abordada pelo capitão responsável pela tropa. Não era um dia para analisar papéis em seu escritório, Amren refletiu com alegria. Ser general tinha seus benefícios, que, convenhamos, não eram poucos, mas a garota sentia falta da adrenalina que era estar lá fora. Sentia falta de treinar até não sentir mais seus membros inferiores e de socar algo até seus dedos sangrarem. Sentia falta de ser uma simples subordinada sendo imprudente pelos becos de El Diablo. O capitão a acompanhou até um dos centros de treinamento, enquanto ela fingia que ouvia o que ele tinha a dizer e mantinha as mãos confortavelmente para trás, os dedos coçando por uma boa briga, que ela sabia que não teria. — E acredite... ele tem muito potencial e gostaria que pensasse calmamente sobre esta proposta. — Que? Pera, volta. Do que ele está falando? Por um momento, Amren se arrependeu de não dar ouvidos àqueles que falavam com ela.

Amren tinhas vagas lembranças do capitão estar falando sobre o primeiro soldado que ela deveria avaliar. Tudo o que sabia era que ele supostamente tinha potencial, mas era um pouco incontrolável, pelo menos em parte das vezes. Ela já tinha ouvido falar sobre o rapaz e seu dom inconvenientemente imprevisível de mudar personalidade e forma o tempo todo antes. Logo, ela pode observá-lo, a curta distância, enquanto treinava com Richard, um ex-soldado da expedicionária e um talento desperdiçado, na opinião da general. Vendo-o o jovem treinando, ela soube que, infelizmente, teria que concordar com seu capitão: o garoto tinha talento. Entretanto, ao vê-la ali, ele perdeu o foco e acabou por levar um soco muito bem desferido em seu rosto, desacordando-o. Ele não demorou a voltar a si, mas suas feições já não eram mais as mesmas. Amren tinha a leve impressão de ter visto o rosto dele se contorcer e mudar bem diante de seus olhos, mas já tinha presenciado coisas demais para desacreditar, então apenas cruzou as mãos em suas costas e esperou até que ele estivesse em plena consciência novamente.

Esperava que pudesse ter uma conversa com o rapaz sobre o seu treinamento e o futuro no exército, mas parecia não ter sido apenas sua aparência física que mudaram com o apagão; ele acordou como um imbecil. Não apenas um imbecil comum, porém, mas um verdadeiro estereótipo de hétero babaca. Com direito a assovios e cantadas ruins. Se Amren fosse uma boa moça que se preocupa com o próximo, ela teria sabido que a culpa não era exatamente do rapaz por ter uma personalidade ruim em sua grande lista. Infelizmente, a garota não era bem uma pessoa. O cabeludinho egocêntrico se aproximou da general, que, sendo uns bons 30 centímetros mais baixa, parecia em desvantagem. Até Richard levou um safanão do brutamontes. Mas ela não tinha permanecido como general por tanto tempo se não soubesse lidar com uma situação como aquela. Ficando nas pontas dos pés para parecer mais alta do que era, a garota sorriu sem mostrar os dentes. — Vem me dar uma cabeçada. Vem! — Ela apoiou uma mão no peito largo do outro, gerando uma carga de energia que deveria percorrer todo o seu corpo internamente. — Eu só dou rolê com homens que tomam banho. — Ela disse, vendo-o perder o equilíbrio aos poucos.