if you mess the letters in "funeral" you'll get "real fun"

A passagem a seguir é FECHADA AOS ENVOLVIDOS. Os envolvidos são Désiré Lancaster e Valentin Lancaster. Em ALBERGUE SE7EN, por volta da MEIA NOITE. O conteúdo que o texto aborda é LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS.

Amor e ódio são duas faces da mesma moeda. No meu caso, eu tinha mil faces e era difícil saber quais delas possuíam tais vantagens e desvantagens. Minha vida era como um emaranhado de peças de um quebra-cabeças, onde eu havia passado toda a minha trajetória tentando montá-las e formá-la num quadro, em algo maior. Estava de frente para um precipício de confusão e caos, onde minha mente se encontrava superlotada. Sabia de atos hediondos feitos por outras pessoas dentro da minha mente, e por vezes isso era impossível de suportar. Quando eu me veria livre de tudo? Eu era um boneco de pano e todos ao meu redor eram como manipuladores infernais brincando comigo.

Meu pai havia mentido para mim, minha mãe, minha avó, todos me fizeram de bobo e eu havia me ferrado e vivido uma vida de serviço aos militares por achar que era a coisa certa, que eu estava honrando o legado de meu pai, mas só estava na verdade seguindo seus passos por pura burrice, afinal que honra tinha o velho Hellioth quando na verdade ele jogara o próprio filho ainda recém-nascido no lixo por ele ser um demônio? Seu preconceito era inimaginável e absurdo. Todas as quimeras eram estranhas ao seu próprio modo e ele não tinha o direito de fazer aquilo. Eu era um metamorfo e tinha várias personalidades, então por que não me jogar também no lixo? Mas não, fui mantido como um mero troféu pois eu era uma espécie de salvador messiânico previsto por sua avó numa profecia idiota.

Tinha poucas companhias em minha vida solitária de soldado da tropa expedicionária, afinal como manter uma vida saudável e ser sociável quando eu vivia fora das muralhas matando e caçando monstros? Talvez uma das minhas únicas companhias fosse meu primo Kitan, que também era da tropa expedicionária assim como eu. Nos dávamos bem e o sexo era delicioso, mas mal nos víamos. Meu irmão Taylor me odiava, mesmo minhas memórias sobre ele tendo sido apagadas por minha avó. Falando na diaba, a mesma ressuscitou após morrer de velhice, entretanto ela voltara jovem e com uma personalidade diferente, e eu sentia que não era ela mesma ali naquele corpo. Mas, bem, vida que segue. Minha última companhia era meu primo Désiré, com eu quem tinha pouco contato e que só vim descobrir um bom tempo depois o motivo de eu não conhece-lo melhor: ele tinha poderes monstruosos, e claro, meu pai decidira julgá-lo como uma aberração.

Aparentemente qualquer um com poderes monstruosos ou sombrios precisava ficar longe de mim para preservar a minha pureza, afinal, segundo ele, eu tinha como destino ser um cavaleiro de armadura dourada e montado num cavalo branco. Eu havia cedido minha casa para Désiré morar na mesma por um tempo, mas sequer cheguei a vê-lo, vide que eu estava fora de Weingarten numa missão de campo por meses. Agora ele tinha um albergue localizado em El Diablo e pelo conteúdo de nossas cartas, ele estava ótimo. Sendo assim, decidi ir visita-lo.

Não posso dizer que El Diablo era um bom lugar, pois eu estaria mentindo. Ruas enlameadas e sem calçadas, casas simples de madeira e barro, com feiras ao ar livre até tarde onde produtos das piores qualidades eram vendidos a preços míseros. Era a personificação da pobreza e mediocridade. Como podiam os distritos serem tão diferentes uns dos outros? Como poderia haver tanta injustiça nesse novo mundo? Havíamos sobrevivido a um verdadeiro holocausto nuclear e ainda haviam classes sociais e castas, com direitos a imperadores e políticos decidindo tudo por nós. Era algo horrível e que parecia ser algo inerente da humanidade: a vontade de serem liderados e de liderar, de serem dominadores ou submissos.

Cheguei ao Se7en próximo da meia-noite, com as mãos dentro dos bolsos de meu casaco enquanto observava o local. Ele era grande, tinha vários andares e era arrumado, pelo menos na medida do possível. Por que ele não criou seu albergue em Kaleo, onde era menos perigoso que aqui? Estreitei os olhos, batendo na porta e esperando por Désiré.

O lugar parecia muito belo e arrumado do lado de fora, por dentro provavelmente deveria ser bem aconchegante e confortável. De costas enquanto esperava impacientemente que Désiré viesse ao meu encontro, senti um brusco golpe na minha nuca, fazendo-me perder a consciência devido a potência do ataque surpresa. Sério? Agredir alguém pelas costas? Senti o mundo murchar, à medida que tudo ia ficando escuro. Pude ver uma silhueta vindo em minha direção e tudo aquilo no que pude pensar foi em meu primo: essa pessoa que me opugnou poderia ir atrás dele, se é que já não tivesse ido. Tentei usar meus poderes, mas tudo o que fiz foi transformar minha mão em fumaça, a qual encarei-a tentando espalhar a metamorfose para o resto do meu corpo, mas sem sucesso algum.

Despertei com um sobressalto, ouvindo o som agudo do tilintar de metais. Pelo som, só poderiam ser facas. Engoli em seco, uma luz turva acima de mim, dançando enquanto minha mente tentava se manter firme. Tentei mover meus membros, mas me vi preso por cordas. Vi uma figura de costas para mim mexendo em seus instrumentos de tortura. Mas que porra? Ele se achava poderoso e o senhor da tortura, não é? Pois bem, ele que se foderia agora. Transformei meu corpo em água, escapando facilmente das cordas e deslizando da mesa. Nessa forma sentia uma liberdade e expansão sem igual, e então assomei todo o líquido e modelei tudo numa forma de gelo, parecida comigo normalmente.

— Désiré?! — berrei, apontando minha mão direita enquanto meu braço se transformava numa afiada ponta de lança.

Désiré? Boquiaberto, apenas o encarei sem saber como reagir. Meu primo havia mesmo me sequestrado e me amarrado a uma mesa com o objetivo de me ferir? Por quê?! Ainda com o braço estendido para ele, tentei pensar em alguma justificativa para defende-lo, mas nada me veio à mente. Ele havia mesmo me ferido e me sequestrado e isso era impossível de perdoar.

— Você tem trinta segundos para me explicar porque fez isso, ou vou te furar da cabeça aos pés. Anda, Désiré! — esbafori irritado, ainda com o braço mirando seu peito, pronto para atingi-lo no seu primeiro descuido. Como ele podia simplesmente fazer aquilo comigo? Nunca brigamos e mal nos víamos quando pequenos, deveríamos ser unidos, não?

O fato de Désiré estar furioso por eu estar ali apenas denotava sua culpa. O que ele fazia ali que tanto queria me manter afastado? Ele havia me imobilizado com certa facilidade, provando toda a sua sutilidade e então me amarrado a uma cama. Ou ele era algum tipo de dominador sexual ou então um sádico perverso e cruel – e dado o histórico familiar da nossa família, ele podia muito bem estar equilibrado entre os dois polos; a perversão e a perversidade. Meu primo não parecia estar bem, o que me deixou preocupado com ele e com a sua situação atual.

— Por que me pegou dessa forma? Estava tentando ferir alguém? — questionei alisando minha nuca, retornando à forma humana, porém deixando meus sentidos em alerta para qualquer ataque por causa dele. — Eu sou militar, posso ajuda-lo a lidar com problemas relacionados a bandidos, primo.

Algo me dizia que o problema não era esse, que ele estava envolvido em algo mais sombrio, profundo e assustador – e eu não sabia se isso me assustava ou me deixava excitado para poder conhece-lo melhor. Era como se todos nós fôssemos frutos podres em uma bela árvore frondosa, cuja aparência atraente e voluptuosa enganava a todos. No momento, Désiré era um belíssimo fruto misterioso.