Marcados

A passagem a seguir é FECHADA AOS ENVOLVIDOS. Os envolvidos são Cartaphilus Ainsworth e Freya Belikov. Em algum lugar por El Diablo, por volta das 19 horas. O conteúdo que o texto aborda é PARA TODOS OS PÚBLICOS.

Há 13 anos, o ancião de uma organização encontrou uma novata. Apesar das histórias tão discrepantes, possuem um objetivo em comum e uma marca eterna para lembrá-los disso.

m a r c a d o s

A noite era fria, você conseguia lembrar. As gotículas gélidas batendo de encontro com seu rosto e fazendo com que seu nariz se enrugasse de leve ao sentir o toque. Echo achava sua expressão engraçada e sorria, o que te deixava um pouco mais calma e tranquila. A própria mulher exalava essa aura: tranquilidade, confiança, de forma que era praticamente impossível não gostar ou confiar nela. Se por acaso ela virasse e dissesse que o mundo acabaria em 15 segundos, você acreditaria, mas, não surtaria. Não sabe ao certo o motivo, as coisas com Echo sempre eram assim. Um grande mistério para qualquer um.

Mais cedo naquele mesmo dia ela havia tido uma conversa contigo, aparentemente bem séria. Olhou em seus olhos, e, pela primeira vez, você identificou medo. Não era algo como: Freya, você corre perigo. Não, era algo mais grave, mais sério. Era como se ela estivesse prescrevendo um destino para ti, onde, você mesma não poderia tomar, ao certo, todas as decisões dali em diante. Teria de preencher um livro que ela não conseguiria. O fato de correr o risco de perde-la, pela primeira vez, se fez presente em sua mente, e, a partir daí, você compartilhou o que ela estava sentindo. Pouco tempo depois ela chegou com um ferro quente, pegou sua mão e encostou ali, fazendo com que uma espiral ficasse desenhada.

As gotas de chuva te lembravam as lágrimas mornas que haviam escorrido, a mão dolorida estava escondida embaixo da manga do casaco, mas, apesar de tudo isso, você não sentia raiva da mais velha, pelo contrário, o ato parecia ligar algo em sua mente. Algo muito maior. Echo havia lhe ajudado, e muito, principalmente quando Banshee aparecera pela primeira vez. Já ouvira falar de invidualidades antes, mas,  nunca em algo como aquilo. Quem você seria? "Freya, a esquisita". Certamente, a primeira coisa que passou em sua mente. Mas não era bem assim.

O ritmo de Echo havia mudado, provavelmente vocês estavam próximas do lugar marcado. Ela não era de dar muitos detalhes, totalmente misteriosa. Você havia aprendido isso com o passar dos anos, e, de alguma forma, havia transformado isso em algo, digamos, confortável. Ela apertou sua mão com um pouco de firmeza, e, lhe levou para o outro lado da rua. Estava escuro demais para que você pudesse enxergar algo direito, mas, no fim da ruela, você conseguia distinguir alguém esperando por vocês. O coração ficou um pouco acelerado, você não era familiarizada com terceiros e isso ainda a deixava um pouco tensa.

O homem estava parado, vestia uma grande capa esvoaçante. Em suas costas havia uma espécie de leque, você não fazia ideia do que poderia ser ao certo. O que mais chamou sua atenção foi uma mascara. A mascara com o mesmo padrão de espirais que Echo havia marcado em sua mão. E os olhos. Vermelhos. Você deu um passo para trás mas a mulher segurou sua mão com firmeza e sussurrou algo como: tudo bem, Freya. E sorriu.

— Espero não ter me atrasado, Cartaphilus.

” THE DEATH

m a r c a d o s

Echo parecia séria, porém, sua postura protetora acabou te deixando mais calma. Certamente não era comum ver um homem mascarado por aí, principalmente com aquele padrão de máscara tão... estranho. Você estava tensa e sua mestre a fazia relaxar, ou, pelo menos, ela tentava. Você nunca foi muito boa em diplomacia, fazer amizade com pessoas novas não era bem o seu forte, porém, a mulher fazia questão de que fosse em encontros como aquele. Parecia querer que você conhecesse algumas pessoas, que, para ela, pareciam ser importantes.

O homem a sua frente parecia um tanto impaciente, aparentemente queria se livrar logo daquela situação, parecia estar achando tudo uma perda de tempo. Você não ficava muito atrás, também estava desconfortável, no entanto, o encontro parecia necessário. Echo deu um passa a frente, ficando mais próxima do homem, soltou sua mão e ergueu ambas em direção ao rosto alheio, pousando-as na máscara branca com o mesmo padrão de espiral que, agora, sua mão possuía. A mulher retirou a máscara do outro, mostrando, enfim, seu rosto.

— Cartaphilus, você tem sido a peça chave para que tudo isso aconteça. O mundo, agora, não é mais como antigamente, você sabe disso mais que qualquer um. Mas, esse mundo, possui os mesmos homens. A mesma ganância de sempre. Olhe ao seu redor. Olhe essa pobreza. Basta. Precisamos nos erguer contra isso. — As palavras de Echo pareciam firmes e intimidadoras, porém, você não conseguia compreende-las como o mais velho, que assentia. Echo se aproximou do mais velho, e, segurando seu rosto, depositou um selinho em seus lábios. Não era algo sexual, mas, algo fraterno. Como uma mãe com seu filho. — Meu bem, deixo tudo em suas mãos.

A mulher se afastou do mais velho e se abaixou ao seu lado, bagunçando seus cachos e sorrindo para ti. Você sentiu-se bem, porém, um sentimento nunca antes experimentado, feria seu coração, deixando-o apertado. Ela depositou um beijo demorado em sua testa, e, no momento seguinte, lhe deu um selinho nos lábios, assim como havia feito com Cartaphilus. Você a observa, sem entender a situação, e, quando ela fica de pé, você se afasta.

— Me desculpe por isso, Carta.

E, falando isso, caminhou para o centro da praça, onde todos podiam vê-la. Fazendo isso, ela liberou sua individualidade. Diversas dobraduras de papel surgiram, envolvendo-a, rasgando sua pele, dilacerando-a aos poucos. Você ficou perplexa, deu um passo para trás e cobriu a própria boca. Os guardas correram naquela direção, Echo gritava como uma louca, descontrolada, e, por fim, apontou para você e para o homem ao seu lado, chamando atenção para ambos. Em seus lábios podiam-se ler algumas palavras, apesar de indistintas: fiquem juntos. Le ange. Desculpe. Marcados.

” THE DEATH

m a r c a d o s

O sangue começou a manchar os papéis dos origamis de Echo, dobraduras que ela sempre mostrara para você com tanto amor e carinho, repletas de histórias que lhe contava antes de dormir. Anos antes seus pais haviam sido tirados de você, viver nas ruas e sozinha fora um tremendo inferno. Echo lhe encontrara, cuidara de ti e lhe dera o que seria mais digno dentro daquele império. E, agora, ela simplesmente a entregara nas mãos de um estranho e se jogara para a própria morte.

Foi surpreendida quando o homem agiu rápido o suficiente para lhe tirar dali. Ele recolocou a máscara e segurou de forma firme em sua mão, correndo para longe das vozes dos guardas, que, já haviam os localizado e corriam, mesmo que a distância, atrás de vocês. Porém o mais velho parecia conhecer cada rua daquele lugar, guiando-lhe para fora dali, e, para o mais perto do que seria segurança.

Ele parou depois de um tempo, o terreno, pelo menos naquele momento, parecia estar seguro para ambos. Os guardas deviam estar longe agora, você e Cartaphilus eram os únicos ali. Cartaphilus. Que nome estranho. Você sentia como se houvesse algo de familiar nele, mas, ainda sim, algo de estranho e distante. Suspirou, observando a máscara e, só então, mostrando sua mão, de palma para cima, par ao outro. Em seguida, dizendo seu próprio mome.

— Meu nome é Freya. — Você falou, simplesmente, encarando-o. — Aparentemente ela quer que encontremos os outros. Isso é, se eles existem. — Suspirando, você dá um passo para trás e se escora em uma mureta baixa que havia ali. Suas mãos vão em direção ao seu rosto, demonstrando clara preocupação. — O que eu faço agora?

” THE DEATH

m a r c a d o s

Ele parecia ser um solitário, não daqueles que se sentem sozinhos e vivem mendigando por atenção. De alguma forma você sabia que ele era experiente o suficiente para preferir ouvir o som do silêncio e ficar na companhia de si próprio. Aquilo, certamente, era algo que você mesma precisava aprender. Sabia lutar, sim, mas, de que adiantaria? A espada deve ser uma extensão do corpo, é que o Echo sempre lhe dizia. E a mente deve estar livres de pensamentos alheios. Você suspirou e assentiu, concordando com as palavras alheias.

Aparentemente ele concordava com a tarefa que Echo tinha designado para ambos, no entanto, vocês dois sabiam que não seria algo fácil. O reino era gigantesco e não seria moleza encontrar os marcados pela mais velha. Ou, simplesmente, fazer com que eles ouvissem o que tinha a dizer, e, se relevarem. Você sabia disso, tinha plena consciência. Precisava estar em uma posição onde transitasse com livre arbítrio. Uma posição em que os muros não lhe segurassem.

Foi aí que a razão pela qual Echo sempre lhe treinara desabrochou. As palavras de Cartaphilus faziam com que você sentisse que estava livre para escolher o caminho que realmente queria seguir, e, sentiu-se tentada a largar tudo aquilo e viver nas ruas. Fosse como uma rebelde, fosse como uma pedinte... pouco lhe importava. Mas a mestre não havia se empenhado tanto para te ver desistir no primeiro obstaculo, e, isso acabou pesando um pouco em sua consciência.

— Ficarei onde possa ter olhos. — Sua voz era firme e determinada. Ali havia nascido uma nova Freya. — Vou me alistar à guarda. Assim poderei ter acesso à informações que dizem respeito ao império, e, de quebra, poderei passar pelos muros. — Você suspira e observa as marcas estampadas na máscara alheia, fazendo questão de memorizá-las para a próxima vez que encontrasse aquele homem, ou, outros homens. — Adeus, Cartaphilus. Nos encontraremos em breve.

ENCERRADO

” THE DEATH